31/10/2007

O verso e o reverso

No passeio das horas
contei as pedras do tempo.
Hoje sei onde moras.
Vim no rasto do vento.
Nos jardins dos dias
gozei as pétalas oferecidas.
Não disseste onde ias,
deixaste promessas esquecidas.
No livro dos anos,
deixei páginas rasgadas,
não há índice de danos,
apenas folhas douradas.
Na berma do futuro
larguei as minhas mágoas.
Entre nós há um muro
que desvia as nossas águas.
No caminho de regresso
assinalei minha presença.
Vais descobrir o reverso
do sinal de pertença.
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Pedro Arunca
2007/11/01

27/10/2007

Poema anorético

Era um poema tão hermético
que nem a alma se lhe via.
Com um título atlético
que, ainda mais, o reduzia.
De corpo tão esquelético,
não conseguia respirar.
As voltas foram tantas,
ficou zonzo a cambalear.
Nem o calor das mantas
o tirava do torpor.
Sem ponta por onde pegar.
Fiquei de mau humor.
Não o pude amparar.
Havia uma palavra ou outra
sujeita a tal compressão,
como a frase era rota,
não fazia oração.

As rimas andavam soltas
como as folhas do Outono.
Os versos davam voltas,
pareciam cão sem dono.
Osso duro de roer.
Não o lia de nenhum jeito.
Quem o haveria de ler?
Achá-lo-ia imperfeito.
As palavras estão caras,
mas não sou de poupar,

penduro-as nas varas
para o vento as levar…

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Pedro Arunca
2007-10-27

Deixa o teu coração florir

Pisaram os canteiros do teu jardim
Tanto trabalho deitado por terra
Que mal fizeram as flores?
Há quem declare guerras
Mas não ganhe nos amores

Sei que choras as rosas vermelhas
Tratadas com mil carinhos
Teu coração magoado
Também guarda espinhos
Ele merece de mais cuidado

Retira as pedras e as ervas daninhas
Revolve a terra com paixão
Choveu? O sol há-de vir
Solta e abre o teu coração

Deixa-o florir
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Pedro Arunca
2007/10/27

26/10/2007

Viajo com a minha guitarra

Viajo com a minha guitarra
Conto minha história numa canção
Vejo poesia na rua, no mar e na lua
A tudo a minha alma se agarra
Cresce uma hera no meu coração

Beijo o mundo com minhas mãos
Canto as palavras que te fazem feliz
Para me sentires basta me ouvires
Meus amigos são como irmãos
Faço desta terra o meu novo país

Sou um solitário viajante
Carrego comigo pouca bagagem

Em cada terra vi sua guerra
Esperas de mim um eterno amante
Sou real, não uma miragem

Sinto no peito uma dor
Sonho com um novo despertar
Sou homem novo que ama seu povo

De tanto amar, conheço o amor
Dá-me uma chave para eu ficar


(Poema dedicado ao meu amigo Helder.
Parabéns amigo! Para quando uma música com poema meu?
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Pedro Arunca
2007-10-26

24/10/2007

Palavras desertas

Caminhar, sob sol ardente, na direcção do oásis.
Miragem?
Sombras, no horizonte, decalcadas nas dunas.
Tu?
Núvens que se agigantam pairam sobre mim.
Chuva?
Ventos rodopiantes moldam-me o corpo.
Tu?
Surge uma caravana. Peço água.
Tu!
Esqueço a sede. Bebo da tua boca.
Beijos!
Doces tâmaras saciam minha fome.
Teus seios!
Envolvente brisa. Refrescante elixir.
Teu corpo!

Estas palavras foram dedicadas a Alif e à sua amada Odasélia.
Alif era um beduíno que se perdeu, por amor, numa tenda onde conheceu Odasélia. Ela tinha: nos olhos, as estrelas da noite; na voz, o silvo do vento; no corpo, um oásis. Amaram-se, em todas as dunas, durante muitas luas. Um dia choveu tanto que se apagaram as pégadas de Alif. Os trilhos e as dunas ficaram irreconhecíveis. Ele perdeu-se num deserto de muros de cimento. Ela, depois, perdeu-se em muitos braços.
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Pedro Arunca

1992

21/10/2007

Caixas de histórias

Numa caixa de sapatos
guardo pedaços da vida:
cartas, postais e retratos.
Minha estrada percorrida.
Noutra caixa de cartão
escondo alguns poemas,
sairam da minha mão
e abordam vários temas.
Nas caixas pequeninas
juntei diversa tralha:
canetas grossas e finas
e mais o que lá calha.
Porta-chaves, calendários
e selos dos correios,
são os meus relicários.
Registos dos meus passeios.
Cada coisa tem uma história
com a sua referência.
Mais valor tem a memória
o tesouro da vivência.

19/10/2007

Na pesca


Pela Ponte, até à praia,
chego à ponta do esporão.
Muitas pedras, puxou o mar,
levam lapas e muito mexilhão
Ponho isco no anzol.
Lanço e espero pelo sinal.
Pica o peixe apressado,
puxa a bóia para baixo.
A ponteira fica dobrada,
pesco um sargo “palmeiro”.
Pois este já tem medida,
no balde preto é o primeiro.
Ponho mais chumbo no fio
para afundar depressa.
Prende a linha numa rocha.
Apanhei um ouriço!
Picam muito os seus espinhos,
pois já tive essa experiência.
Pego nele com cuidado,
quando crescer que apareça.
Na pesca não há profissões,
apenas “companheiros”.
Há sempre um cumprimento.
Cada um ocupa o seu espaço,
onde impera o respeito.
Preia-mar de calmaria.
Só um peixe eu apanhei.
Sopra o vento, do Espichel.
Passo a tarde para uma foto.
Põe-se o sol na Caparica.
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Pedro Arunca
2007-10-19

15/10/2007

A minha avó tinha um gato

A minha avó tinha um gato
que brincava no meu sapato.
Não gostava de sobremesa
mas cheirava de certeza.
Sempre que eu chegava,
ele me cumprimentava.
Dormia no meu colo
e gostava de consolo.
De orelhas em alerta,
despertava pela certa,
se alguma coisa ouvia.
Lá ele me fugia.
“Bicho, bicho” - chamava eu –
Acho que nunca me respondeu.
Quando à noite se escapava
o galinheiro acordava.
Os cães presos, num alvoroço,
de vigia a um osso
não paravam de ladrar.
Só o gato podia caçar.
Teriam, eles, inveja
da vida de Sua Alteza?
Por vezes não aparecia,
nem de noite nem dia.
Tinha eu pouca idade,
fiz-lhe uma maldade:
Parecia uma bala!
Maldita bengala!
Nunca mais apareceu.
Foi a mim que mais doeu.
À minha avó, nunca contei.
Jamais o esquecerei.
__________
Pedro Arunca
2007-10-15

Se...

Se restar uma folha na árvore
Se a Lua vier esta noite
Se o trovão me acordar
Se o Sol voltar a nascer
Se os pássaros ainda cantarem
Se o meu corpo mexer
Se os meus olhos abrirem
Se as pernas me levarem
Se os caminhos estiverem livres
Se ainda te lembrares de mim
Se me olhares nos olhos
Se me deixares tocar-te
Se eu ficar contigo

Então, vou querer acordar para te ver sorrir e escreverei a Deus uma carta, com tinta do meu sangue, agradecendo-Lhe por me devolver o sonho e a paz.

12/10/2007

Palavras soltas

Há palavras que nos sujeitam ao verbo
e preenchem o silêncio do olhar

09/10/2007

Ainda há tempo para escrever um poema
ver as horas na sombra duma árvore
deixar o sol pousar na mão e os olhos seguirem as aves

06/10/2007

Outono

Abalaram as andorinhas
ficou o silêncio nos ninhos
Os tractores num vaivém
fazem novos caminhos
com destino aos lagares
Restam poucas vinhas
para ir rebuscar
as uvas de ninguém
As folhas esvoaçando
lembram aves feridas
os miúdos arrastando
fazem grandes corridas
até o fundo da ladeira
O monte de folhas secas
serve para brincadeira
A garotada se rebola
nas férias derradeiras
Já compraram a sacola
e largaram os calções
É em casa e na escola
que aprendem as lições
para enfrentarem o mundo
O rio corre ainda devagar
O tempo arrefece
As cabras com seus guizos
comem do pasto que as aquece
Os campos ficam lisos
Os fogos foram um inferno
Os pinheiros que sobraram
vão aquecer o inverno
dos filhos que os herdaram
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Pedro Arunca
2007/10/06

04/10/2007

Bolo de aniversário

Não me lembro de ninguém que faça anos hoje mas, como há muito não ponho aqui receitas, cá vai uma doce:

Siga a receita como sendo um encontro (bolo) de amigos (ovos) de verdade (gema). Num local aprazível (forma), onde possam trocar umas ideias (claras), não esqueça que eles não são todos farinha (trigo) do mesmo saco: adicione, misture e bata nos temas (ingredientes) do agrado geral mas respeitando a opinião de cada um (dosagens). Adoce-lhes a boca (mel) e não poupe um elogio (manteiga) e uma oportuna piada (sal). Brinde (porto) à amizade e à saúde de todos e agradeça (seu papel).

O bolo…

Ingredientes:
6 claras
5 gemas
1 pitada de sal
2 colheres de mel
300 g de açúcar refinado
500 g de farinha de trigo
200 g de manteiga
0,6 dl de vinho do Porto
Papel vegetal



Mãos à obra
1 - Bata as claras, com pitada de sal, até apresentarem alguma consistência

2 - Ponha as gemas numa taça funda de pirex, mexa-as, misture-as com o açúcar e junte as claras já batidas. Sobre uma panela ou taxo com água quente, junte 2 colheres de mel e vinho do Porto, bata tudo de modo a engrossar. Deixe de fora a arrefecer (4 a 6 minutos).

3 - Junte aos poucos a farinha, misturando com o Salazar de modo zig-zag e sem levantar (para manter o ar).
4 - Numa forma preparada (untada com manteiga, polvilhada com farinha e forrada com papel vegetal), despeje a massa devagar com auxílio da espátula.
5 - Leve ao forno a 170º de 25 a 30 minutos.
Desenforme.
6 - Sugestões para recheio e cobertura:
Mousse chocolate, chantily, Baba de camelo *

Recheio: corte o bolo ao meio, na horizontal, aplique sobre a metade inferior uma camada generosa e reponha a outra metade.
Cobertura: pode optar pelas sobremesas* à venda no comércio e decorar com bombons, pintarolas, smarties, M&M’s ou gomas sugestivas.

Versão+Rápida+Económica=Original
Comprar Pão-de- + sobremesas e aplique-se no passo 6.
Parabéns a você…

01/10/2007

Dia Mundial da Música

A música preenche-me o intervalo das palavras e o silêncio do olhar. Sem ela não imagino o mundo que me rodeia.
Recordo os filmes mudos que ganhavam dimensão por via da música. As cenas de suspense, emoção e drama nos ritmos, andante, moderato, allegro ou fortissimo mexiam comigo.

http://br.youtube.com/watch?v=U4-eXq4I37k